quinta-feira, junho 16, 2005

Mau jornalismo

Hoje arrependi-me dos 85 cêntimos que gastei na edição do "Público". Nunca comprei o "Avante" na minha vida, mas hoje, involuntariamente, parece-me que o trouxe para casa.
Como sempre, comprei o "Público" sem olhar para a capa. Só quando estava a beber o primeiro café do dia é que reparei na bela fotografia do cortejo fúnebre de Álvaro Cunhal. O problema começou quando li o título da primeira "A última vitória de Cunhal" e depois o antetítulo "Impressionante manifestação no adeus ao dirigente comunista".
"Vítoria"?!! "Impressionante"? Álvaro Cunhal nunca venceu sozinho nenhuma batalha política de relevo nacional. O 25 de Abril não foi nenhuma vitória do PCP, mas sim uma batalha ganha pelos militares do Quadro Permanente das Forças Armadas que levaram a cabo o golpe de Estado que derrubou o Estado Novo. Tal como em democracia, nunca o PCP ganhou qualquer eleição. A não ser que se considere a vitória presidencial de Soares em 1986 como uma vitória de Cunhal...
Quanto ao "Impressionante", é muito feio para um jornal que acredita no "jornalismo objectivo" utilizar adjectivos na descrição de qualquer acontecimento, por muito relevante que seja.

Mas o mais inacreditável surge na página 2, onde aparece um autêntico texto de propaganda política. O título "Líder político até na morte", o lead "Ao som de A Internacional cantada em coro de larguissímos milhares de vozes, Álvaro Cunhal foi homenageado por uma manifestação de força e de convicção política. Tal como tinha pedido", e, principalmente a seguinte entrada do texto não honram a independência e a objectividade a que o Público habituou os seus leitores: "Para que não houvesse dúvidas sobre quem é Álvaro Cunhal, milhares e milhares de pessoas acorreram às ruas de Lisboa, dizendo presente numa monumental manifestação política que foi o cortejo fúnebre e a cerimónia de cremação do antigo secretário-geral. Morrendo como sempre viveu, o líder histórico e refundador do PCP fez questão de que a sua última prestação pública, o seu funeral, se transformasse em mais uma das suas inúmeras prestações públicas ao longo da vida, uma acontecimento político, uma demonstração de força e de convicção política".
O texto de São José Almeida é totalmente opinativo e subjectivo, devendo ter a classificação de "artigo de opinião" e não a categoria de "notícia".

Vou comprar pela primeira vez na minha vida o "Avante" para ver se consigo ler a notícia sobre a morte de Cunhal que desejava ler no "Público". Só tenho que descobrir o dia em que sai e onde se vende. Alguém me ajuda?

2 comentários:

João Santos disse...

Caro Milhafre,
concordo que a jornalista ultrapassou o editor pela esquerda; ou foi o editor que ultrapassou o jornal também e mais pela esquerda ainda.
De qualquer modo, parece-me que esta foi uma vitória do político Cunha. Não ganhou em vida, ganhou depois de passar por ela.
Conseguiu arrasar nas imagens e na quantidade de pessoas presentes, mesmo que a produção do evento tenha ultrapassado a 'mera' questão da expontaneidade; conseguiu, enfim, ter o maior funeral português de que há memória, pelo menos neste século que ainda é jovem.
Em suma, quando qualquer pessoa olhar para esta edição do Público daqui por uns anos, é essa a notícia que vai encontrar, daí eu falar em vitória.
É como no futebol: os resultados é que contam.

Anónimo disse...

There are a few books on the subject, some very