segunda-feira, julho 25, 2005

O Segundo Desporto Nacional!



Acaba o futebol e a nação deprime-se! Alguns, de férias, tentam consolar o desgosto, afogando-o em álcool. Os que trabalham acordam cansados, tristes, deprimidos… Não há bola… A pré-época no fundo é uma coisa sem interesse, é como ver um filme porno quando no fundo o que se precisa mesmo é de sexo… Não se pode discutir o campeonato com os amigos… A vida é injusta! Enfim, para 98% da população (nos quais, graças a Deus não estou incluído) a vida perde todo o interesse. Mas, não fossemos nós o povo reconhecidamente mais inventivo e com maior capacidade de iniciativa da Europa, de há uns anos a esta parte, resolveu-se toda esta questão! Inventou-se o segundo desporto nacional, que tem lugar precisamente durante o hiato de tempo entre épocas do campeonato nacional de futebol. Chama-se Fogonamáta!

O Fogonamáta é um jogo com regras muito simples e garante quase tanta audiência mediática como o próprio futebol, senão vejamos:

Por todo o país existem espalhados vários jogadores com a posição de bota-fogo (digamos, uns 416). Estes são essenciais ao jogo, pois depende da eficácia das suas acções que o jogo em si tenha mais ou menos interesse. Quando bem sucedido, cada bota-fogo terá ateado um ou dois incêndios de média ou grande dimensão numa dada região, que normalmente é a da sua área de residência. Caso falhe a sua missão, ou seja não consiga pegar fogo ou apenas provoque um pequeno fogacho, fácil de apagar, o jogador será sancionado e expulso da liga nacional de Fogonamáta. É por isso que todos os jogadores na posição de bota-fogo tentam dar o seu melhor. Outra penalização possível para os mesmos acontecerá caso seja descoberta a sua identidade. Neste caso procede-se a uma suspensão durante uma época, em que o jogador é condenado a treinar um ano inteiro a pegar fogo a lojas de bonsai podendo utilizar apenas fósforos dos pequenos e sem auxílio de qualquer carburante extra, como por exemplo a gasolina.

Posto o fogo, entram em campo os segundos jogadores, os chamados apagó-fogo, que o público, carinhosamente, apelida de bombeiros. Este grupo, bastante maior em número do que os bota-fogo, tem como missão no jogo apagar os incêndios provocados pelos primeiros. Trata-se de uma espécie bastante interessante, pois dada a sua fraca remuneração e facto de correrem risco de vida, continuam insistentemente a alinhar todos os anos no mediático Fogonamáta (o que atesta o sucesso desta modalidade). Para estes as regras também são simples; basta que tenham o equipamento mais obsoleto que se possa encontrar e o mínimo possível de ajudas do estado para poderem entrar no jogo. O objectivo dos apagó-fogo é sofrer o mínimo de baixas apagando o fogo no menor espaço de tempo possível. Dadas as condições precárias em que desempenham a sua função e os elevados riscos envolvidos na mesma, estes são normalmente muito apreciados pelos adeptos deste jogo, chegando mesmo a atingir o estatuto de heróis (se bem que os mesmos adeptos, ou pelo menos a maioria, se está completamente nas tintas para dar qualquer espécie de apoio prático ou concreto aos mesmos, parecendo que consideram os aplausos e umas frases bonitas o suficiente para o efeito).

Os terceiros e últimos participantes têm um papel mais passivo. No entanto a sua função não deixa de ser fundamental para o desenrolar do Fogonamáta. São eles as forças nacionais de segurança e a classe política. Ambos têm duas funções no jogo. A primeira é mediatizar com alguma regularidade uns discursos de motivação aos apagó-fogo, mostrado algum interesse pelo seu trabalho e dando a ilusória esperança de que o mesmo vale a pena. Nesta acção cabem ainda umas promessas para o futuro que, por razões óbvias, nunca são cumpridas. A segunda é garantir a protecção e segurança dos bota-fogo, pois ao longo do jogo é natural que (como acontece com os árbitros no futebol) a população interprete as suas acções como erradas e lhes queiram fazer a folha. Ora o estado tem de garantir que estes jogadores cumpram a sua parte em segurança, pois são jogadores muito caros e com um know-how e uma determinação que os tornam preciosos. Até porque a sua extinção significaria o fim da própria modalidade e portanto uma grave crise no sector dos media durante o período do Verão, o que, vamos lá ser honestos, não interessaria a ninguém. E é isto o Fogonamáta, o segundo grande fenómeno português a seguir ao futebol!

PS – A mim e à minha família já arderam algumas propriedades, das quais dependiam rendimentos importantes. Aos bombeiros deste país deixo um obrigado sincero pela sua coragem e determinação e faço votos para que num futuro próximo lhes sejam dadas as condições e o reconhecimento REAL que merecem. Aos incendiários deixo aqui uma mensagem de ódio pessoal, desejando apenas que se não arderem por cá num dos seus próprios incêndios, acabem por arder nutro sítio a que muitos chamam de inferno!

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